Desatando Nós


Era uma vez... E não era...

Um lugar no qual não se chegava em nenhum lugar. Era como um plano com uma neblina branco esfumaçada que às vezes ficava escuro e frio de repente, por alguns instantes.

Andando por aquele plano, sem rumo, estava Síria, uma jovem mulher na faixa dos 30 anos. Ela simplesmente andava e andava e depois parava. Não sentia fome, não sentia sede, não sentia nada. Apenas quando o frio vinha que gélida era chorava. Ela não sabia porque estava ali.


Naquela mesma mesmice, certo dia ela viu um vulto esbranquiçado. Ficou apreensiva mas decidiu se aproximar. A medida que chegava mais perto foi percebendo que o vulto era uma menina de sete anos. Ela lhe parecia familiar, mas sua mente estava tão entorpecida que não conseguia fazer ligação alguma. 

A menina gentilmente olhou para ela e disse:
_ Você quer sair daqui?
_ Sim, eu quero! Respondeu Síria um pouco ainda confusa.
_ Eu posso lhe tirar daqui, mas para isso você terá que desmanchar cada nó desta rede.

De repente, como se aquela neblina branca esfumaçada se abrisse, Síria viu uma imensa rede de pesca com vários nós. 

_ Mas vai demorar muito tempo!

Não obtendo responta nenhuma, Síria percebeu que a menina havia desaparecido. Então, ficou ali, olhando para rede, sem coragem de começar. Levaria muito tempo para desmancha cada nó. E pra quê todo este trabalho?. Era preferível ficar ali, pelo menos não tinha que fazer nenhum esforço.

Síria voltou a caminhar sem rumo, mas seja em que direção fosse, a rede de nós aparecia. Não podia ignorá-la. Diante disso, então, decidiu começar: um nó de cada vez. Cada nó era duro e custoso, mas ela ficou ali, concentrada em cada nó, desatando... Desatando.

Depois de um tempo, Síria se surpreendeu com a voz da menina:

_ Você terminou! Como se sente agora?
_ Me sinto bem, me sinto livre!
_ Veja a sua volta!

Síria olhou ao redor e a neblina branca esfumaçada havia sumido. No lugar um plano aberto e luminoso.

_ E agora?
_ Agora é o que você quiser!
_ Qualquer coisa?
_ Sim, qualquer coisa!
_ Eu quero viver de novo!

Naquele mesmo instante Síria percebeu que a menina era ela mesma. Como num passe de mágica, a menina se dissolveu em luz que se dissolveu em seu coração. Ela se dissolveu em luz também e ficou por um tempo neste estado...

_ Foque sua atenção em sua respiração, sinta o seu corpo e quando estiver bem pode abrir os seus olhos.

Síria abriu os olhos lacrimejados e olhou para sua terapeuta, dizendo:

_ Eu estou me sentindo livre, eu quero viver!

Síria havia estado a muito tempo daquele estado entorpecido, mas finalmente conseguiu desatar os nós que havia criado e a mantido lá. Daquele dia em diante começou a fazer mudanças em sua vida, cada uma no seu tempo. Uma delas foi sair de um emprego que a oprimia, e que ela mantinha com a desculpa de ter uma estabilidade. Mudou-se de cidade, abriu uma loja de fragrâncias naturais e passou a viver um dia de cada vez.

Sabia que tinha que ter o cuidado e atenção de não criar nós que fossem difíceis de serem desatados e continuar a desatar outros nós a medida que caminhava. Seguir o fluxo da vida era um aprendizado de cada dia, que requeria aceitação da impermanência e também coragem.


 Juliene Macedo

Escrito em Brasília, 01/10/2012

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