A Arte de Escutar

Ontem, eu assisti a uma palestra transmitia pela internet que estava acontecendo ao vivo em Porto Alegre, direto da Usina do Gasômetro. A palestrante, Chagdud Khadro, professora do budismo tibetano e diretora espiritual do Chagdud Gonpa (conheça a sede no Brasil, em Três Coroas – RS, clique aqui), que falava sobre o tema “Conselhos para Tempos Desafiadores”, mencionou que as pessoas não estão ouvindo umas as outras, preferem mandar mensagens de texto, e disse o quanto era importante ouvir: “ quando ouvimos os outros aprendemos a ouvir a nós mesmos”.


Refletindo sobre o assunto, percebo o quanto hoje é fundamental a arte de escutar. Hoje em dia com o desenvolvimento tecnológico e a vida “corrida”, as pessoas estão talvez diminuindo a oportunidade de parar e escutar o outro. Isso repercute nas relações em vários níveis, como também no desenvolvimento pessoal. A arte de ouvir ou escutar é um exercício de voltar-se para dentro, escutando a si mesmo, e voltar-se para fora, escutando o outro. E ambas as direções estão interligadas.

A arte de escutar possibilita que possamos treinar a compaixão em relação ao outro e a nós mesmos. E a compaixão pode vir de atos tão simples! Muitas vezes também na forma de um não, de limites, porque você é capaz de ouvir o que o outro realmente necessita e responder a isso, mesmo que ele não compreenda. Escutar envolve estar presente no aqui-e-agora. Envolve tomar o lugar do outro e tentar ver a vida sob sua perspectiva... Um bom treinamento! Envolve reservar um tempo para se encontrar com amigos e conversar, compartilhar a vida. Envolve usar o discernimento para não se enredar na fala do outro. Envolve ter sabedoria de trilhar o seu caminho e fazer escolhas com o seu coração... E assim aprender a respeitar as escolhas dos outros também!

Quando você tiver uma discussão com alguém, ou discordar de algum ponto de vista, há um exercício que você poderá fazer:

1. Reserve um tempo para ficar sozinho, cerca de 10 minutos;
2. Feche os olhos e faça sete respirações abdominais profundas;
3. De olhos fechados, repasse a situação da discussão que teve como um filme em sua mente, relembrando a sequencia dos fatos sob o seu ponto de vista. 
4. Depois, volte o filme mentalmente como se estivesse rebobinando-o, e repasse de novo o filme, mas dessa vez se colocando no lugar da pessoa com quem você discutiu ou discordou, fazendo de conta que é ela, assumindo o corpo dela, buscando perceber e sentir as coisas sob sua ótica. 
5. Por último, rebobine de novo o filme desde o início, e repasse-o de novo em sua mente, mas se colocando de fora da situação, como se estivesse assistindo um filme no cinema, observando você como personagem. 
6. Assim que fizer esses três passos, você poderá abrir os olhos e refletir um pouco sobre a experiência. Que ensinamentos você pode tirar dela? O que você sentiu quando estava na sua posição, na posição do outro e olhando de fora a situação?

A compreensão de que cada um de nós vive e percebe a vida de acordo com seu estado de consciência pode nos ajudar a entender o outro e respeitá-lo, mesmo que sua opinião seja tão contrária a nossa, ou possa parecer tão rígida. Lembro-me dos ensinamentos de um professor budista, Lama Samten (clique aqui para conhecer o seu centro em Viamão – RS), em que ele denominou essa diferença de estado de consciência de paisagem. Cada um de nós vivemos numa paisagem mental. Por exemplo, num mesmo escritório, podemos observar uma pessoa que vive numa paisagem de pessimismo, raiva e negatividade interpretando as situações sob essa ótica; enquanto podemos observar outra pessoa que vive numa paisagem de otimismo e alegria que interpreta as mesmas situações sob uma ótica diferente. Quem está com a verdade? Os dois. Aquilo que eles vivem é verdade para eles naquele momento. Se apreendermos isso, podemos ter o discernimento de não nos envolvermos em situações enredantes, criando uma oportunidade de treinarmos a compaixão com sabedoria. 

Saber que é só uma paisagem, e que quando uma pessoa mudar as emoções e padrões mentais que estão por trás de sua interpretação, ela mudará também o seu modo de ver a vida, a sua própria vida, é um bom treinamento de tolerância e perdão. O que não significa ser bonzinho. É importante ter discernimento. 

Este texto está ficando longo para um blog, ainda mais porque eu sei que você não tem tanto tempo assim, não é? Então vou parar por aqui, aspirando que eu e você possamos escutar mais os outros e a nós mesmos! Aspirando que possamos criar, de acordo com nossas possibilidades, oportunidades de encontros. Podemos fazer mudanças de 1%, que já serão bastantes significativas.

Um grande abraço,

Juliene Macedo